A montanha dos sete abutres

fevereiro 25, 2010

O picadeiro do Fórum Social Mundial em Porto Alegre discutiu vários temas, como o imperialismo, a insegurança, a globalização, os pobres, os ricos, os infelizes e os felizes, mas em nenhum momento alguém disse uma palavra sobre um nome: Daniel Pearl. Jornalista do Wall Street Journal, Pearl foi seqüestrado por um grupo de terroristas paquistaneses que exigiram a libertação de presos no campo militar americano de Guantanamo, Cuba, além de um resgate de U$$ 2 milhões. Se os pedidos não fossem aceitos, eles matariam o jornalista em vinte e quatro horas.
Enquanto escrevo este artigo para “O Indivíduo”, Pearl está aparentemente vivo, depois de dias desesperadores em que os terroristas enviaram e-mails para a redação do Wall Street Journal, afirmando que ele já estava morto. Horas depois, chegou uma outra mensagem, informando que “Pearl está (talvez) vivo. Façam seus maiores esforços para libertá-lo”.

Não bastasse a situação complicada, os sequestradores paquistaneses resolveram brincar de jogo da alucinação. Afirmaram que Pearl era um agente da CIA e seria executado sem perdão; depois, falaram que o jornalista não era da CIA e sim um agente do Mossad, o serviço secreto de Israel. Isto não melhorou em nada a sua condição: ele seria assassinado dentro em breve, insisitiram os seqüestradores.
Os terroristas que fizeram este estúpido joguinho se autodenominam Movimento Nacional para a Restauração da Soberania Paquistã. Sim, nós já vimos este filme antes e, sim, por menos reacionário que este artigo pareça, vamos chegar a seguinte conclusão: terrorismo, revolução e esquerdismo estão intimamente relacionados. Eis o motivo do silêncio do Fórum Sócial Mundial: falar de Daniel Pearl, mesmo que ele esteja nas mãos de “fanáticos religiosos” (como os esquerdosos classificam estes lunáticos, numa tática de desinformação grosseira para que o leitor tenha nojo ao ouvir o tema “religião”), é a mesma coisa que cuspir no prato que come – no caso, a ação revolucionária que vê o ser humano como uma mera idéia, e não como uma pessoa com corpo e alma.

Há também um outro motivo. Pearl não é um jornalista-toupeira, um ressentido que lida com os fatos de suas reportagens como se fossem provas indubitáveis de uma ideologia que explica os problemas do mundo. Muito menos um agente secreto, seja da CIA ou do Mossad, como parece ser sua vida com a também jornalista Marianne, francesa, grávida de seis meses, esperando uma menina que já tem nome: Claire.
Pearl foi sequestrado no dia 23 de janeiro quando foi à cidade de Karachi, no Paquistão, atrás de informações sobre uma matéria em torno de Richard Reid, o homem que tinha amostras de pólvora na sola dos sapatos, prontas para serem detonadas em um aeroporto de Miami. Formado pela Universidade de Stanford, Daniel Pearl é conhecido na redação do Wall Street Journal como um sujeito tranquilo e, segundo o diretor de redação Paul Steiger, notório por sua cautela. Parece que nesse ponto a cautela foi interferida por um acaso macabro. Naquele dia 23, Pearl ligou à esposa e disse que iria demorar mais um pouco na procura por uma “fonte obscura”. Ela seria um sheik chamado Mubarak Ali Gilani, do grupo extremista islâmico Tanzimul Fuqra (Partido dos Pobres), que daria informações sobre Reid e suas relações com a Al-Qaeda, o grupo terrorista comandado por Osama bin Laden. Foi combinado um encontro num restaurante, às 18:45 da noite. Quando chegou ao local, estava vazio e escuro. Dois homens se aproximaram dentro de um carro e levaram-no.

Uma semana depois surgiram os e-mails, todos assinados por um tal de “kidnappingguy”, escritos em um péssimo inglês (chamavam Pearl de “mR. DannY”, “Daniel”, ou “mr. pearl”) e extremamente confusos. Uma das exigências até parecia piada: os seqüestradores pediam o retorno de um avião de combate F-16 aos domínios do Paquistão, o que os EUA já fizeram no final da década de 80. Na verdade, os especialistas deduzem dos pedidos duas suposições: ou são terroristas de primeira viagem, ou estão confundindo as autoridades paquistanesas e americanas com pedidos e conjeturas absurdas para retardar o máximo possível as negociações de um refém já morto desde o início da confusão.

Mas a história de Daniel Pearl não é uma mera confusão. É uma tragédia humana, e ela ecoa no fato histórico mais importante do começo do século XX: o Terror de 11 de setembro. É também o climax agoniante de uma série de assassinatos e perseguições cometidas contra jornalistas que estão entre o Paquistão e o Afeganistão. Claro que a profissão de correspondente de guerra sempre foi perigosa. Segundo o Comitê Protetor dos Jornalistas (um nome tristemente irônico), 24 repórteres foram mortos em 2000; em 2001, com a guerra no Afeganistão, o número subiu para 55 jornalistas. A situação teve seus lances de crueldade quando o Taliban sequestrou os correspondentes Maria Grazia Cutuli, do jornal italiano Corriere Della Serra, e Julio Fuentes, do espanhol El Mundo. Enviaram fotos e vídeos dos dois e avisaram que seriam executados “em nome de Alá, o misericordioso”. Parece que a misericórdia deles é outra: Cutuli e Fuentes foram assassinados com tiros no rosto.

A confusão provocada pelos imbecis da mídia em relação a estes “fanáticos religiosos” também não ajuda. Já está claro que os acontecimentos envolvendo o Terror de 11 de setembro não são de origem religiosa. São de interesse puramente político. Osama bin Laden & Cia. Ltda. usam a religião como mote para chamar uma série de incapazes e necessitados a uma luta suicida. Confundem perseverança com determinação, coragem com loucura cega e sem conseqüências. Com os ataques do Exército americano contra o Taliban, os pequenos terroristas resolveram usar os homens da mídia como marionetes políticos para suas causas absurdas. Pearl é um exemplo que apareceu num momento crítico, em que o governo Bush percebeu que caiu na maior cilada da História e está prestes a se envolver numa guerra solitária contra o terrorismo, e também numa época em que o Paquistão está fazendo das tripas coração para ter um conflito contra a Índia.

De fato, todos estes movimentos de “restauração pela soberania da minha aldeia” são de inspiração revolucionária, portanto esquerdista. No Oriente Médio, Santo Antonio Gramsci está prestes a se tornar aiatolá, graças ao investimento da China e da máfia russa, proveniente da KGB, em armas e soldados naqueles homens que, na falta de um sentido da vida e para a vida, embarcam na insanidade de um Alá que nunca existiu nas páginas do Corão. Usar e abusar de jornalistas americanos é apenas uma parte do jogo. Se Osama bin Laden disse em sua última declaração, divulgada pelos jornais ocidentais, que a luta é agora no coração da América, talvez ele não esteja falando em uma linguagem tão figurada. Para estes sujeitos, luta é revolução, e se a revolução está dentro da América, não seria dentro do pensamento das pessoas – dentro da alma humana? Como veremos, aqui no Brasil, esta foi a primeira fase. Depois do dia 11 de setembro, entramos na segunda fase: a da guerra em que a audácia dos canalhas aterroriza os homens de bem.

Ao mesmo tempo em que Marianne Pearl recebia a notícia de que seu marido poderia estar jogado com uma bala na testa, em um cemitério no Paquistão (felizmente, era uma notícia falsa), a estudante de medicina Aline Mota, residente na rua Kansas, bairro do Brooklyn, São Paulo, escutou na parede ao lado vários sussurros de socorro. Se não fosse um corte de energia na rua, sua mãe Nara nunca teria escutado os pedidos e avisado a filha. Percebendo que o desespero do sujeito era latente, Aline resolveu pegar seu estetoscópio, pôs na parede e assim pode escutar o que o homem falava: “Socorro! Socorro! Sou Washington Olivetto e fui seqüestrado!”.

Assim foi respondida uma pergunta que não queria calar há mais de dois meses. Olivetto estava num bairro de classe média, num cúbiculo controlado por câmaras de TV e seu ar vinha de um respirador que, misteriosamente, fora cortado no sábado à tarde. Sentindo-se sufocado, tocou a campainha na qual avisava os seus “guardiões” (era assim que ele deveria chamar os sequestradores, segundo um livro de regras) e percebeu que estava sozinho. Gritar por socorro foi sua primeira reação e, quando foi libertado pelos policiais, deu graças a Deus e disse que estava lá há 60 dias.

Na verdade, ele estava há 53 dias, o que não é nada perto dos 120 dias de cativeiro do empresário de Salto, Roberto Benito Júnior, das Lojas Cem. Mas Washington Olivetto representa tudo o que São Paulo tem de cosmopolita: dono da W/ Brasil, venerado pelos publicitários como um dos mais criativos do país, sempre simpático na imprensa, eloqüente e bem relacionado nas redações dos grandes jornais, Olivetto também tinha um plus sobre seu caso. Ele fora seqüestrado por uma quadrilha estrangeira.

Imeditamente, veio um nome e um rosto na mente dos jornalistas brasileiros: Abílio Diniz. Em 1989, em plena campanha presidencial, o dono das empresas Pão de Açucar foi seqüestrado por um grupo de chilenos, canadenses e brasileiros. Graças a um erro crucial – um dos integrantes do grupo havia esquecido, dentro do carro usado para o sequestro, uma nota fiscal de uma oficina em que havia o número do telefone do cativeiro – , a polícia descobriu o local e logo o cercou, começando uma das mais tumultuadas negociações já feitas, e uma das mais esquisitas, em que o senador Eduardo Suplicy, do PT, o candidato Luís Inácio Lula da Silva, também do PT, o então senador Fernando Henrique Cardoso e o procurador Aloysio Nunes Ferreira, conhecido nos corredores da guerrilha comunista como Matheus, lutavam pela preservação dos… seqüestradores!

Diniz foi libertado e a quadrilha foi presa. Seus integrantes estavam vestindo camisetas do PT – um insólito detalhe que, até hoje, acredita-se que foi uma artimanha do governador Orestes Quércia para afugentar os votos de Lula. Pode até ser, apesar do PT, como o próprio Suplicy confirmou em entrevista sobre o caso Olivetto, manter contato com os remanescentes da quadrilha que foram extraditados para o Chile e para o Canadá. Para intensificar a ligação, livros de teor esquerdista, como os diários de Che Guevara e um manual mimeografado de Carlos Marighella, foram encontrados na época, junto com adesivos do PT louvando a candidatura de Lula.

Como num ricorsi de Vico, a história se repetiu com Washington Olivetto. Uma parte da quadrilha foi presa em Serra Negra: era, ao que parece, a célula-mãe da operação, já que o líder estava presente. Seu nome é Maurício Fernandéz Norambuena, oficial e chefe operacional da Frente Patriótica Manuel Rodriguéz, braço armado do Partido Comunista chileno. Seu currículo como revolucionário é bem interessante: com duas condenações de prisão perpétua no Chile, Norambuena é responsável pelo seqüestro do filho do proprietário de um jornal direitista, “El Mercurio”, e é um dos acusados de ter assassinado o senador Jaime Gúzman, ideólogo do governo do general Pinochet.

Mesmo que não haja motivações políticas diretas no caso Washington Olivetto, não se pode esquecer que estes sujeitos bebem, comem, cheiram e respiram a política revolucionária. E mais: não são pessoas da periferia. São intelectuais da melhor estirpe. Norambuena, por exemplo, é um leitor de Rimbaud (um dos livros encontrados no cativeiro de Olivetto era uma edição em castelhano de “Uma Temporada no Inferno”), além de ser formado em (advinhem?) jornalismo. Outro sequestrador, Rubem Oscar Sanchez, de 30 anos, alegou em seu depoimento com muito orgulho que era formado em quatro faculdades, entre elas (também advinhem?) filosofia e sociologia. “Eram sujeitos muito bem articulados”, comentou o delegado da Deas (Delegacia Anti-Sequestro), Wagner Giudice. “O raciocínio de Maurício era muito rápido, ele estava muito bem informado, e os outros mostravam o mesmo nível de inteligência”.

Infelizmente, o delegado Giudice confundiu inteligência com malícia. Os procedimentos da quadrilha de Norambuena seguem, passo a passo, os ensinamentos básicos de uma boa guerrilha política. Segundo o livro “Comando Vermelho – A História Secreta do Crime Organizado”, de Carlos Amorim, apud Olavo de Carvalho em “A Nova Era e a Revolução Cultural“, estes são o “decálogo” do bom revolucionário que parte para a luta armada:

“1 – Realização de assaltos simultâneos em vários bancos, para desorientar a polícia.

2 – Com o mesmo objetivo, bombardear os postos policiais com dezenas de alarmes falsos, no dia dos assaltos planejados.

3 – Não sair para uma operação armada sem deixar montado um “posto médico” para atender os feridos (que antes os bandidos deixavam à sua própria sorte, expondo-se à delação por vingança).

4 – Em caso de emergência, invadir pequenas clínicas particulares selecionadas de antemão, obrigando os médicos a dar atendimento aos feridos.

5 – Planejamento e organização de sequestros.

6 – Designar para cada operação um “crítico”, que não participa da ação mas apenas observa e assinala os erros para aperfeiçoar a ação seguinte.

7 – Planejar as ações armadas com exatidão, de modo a obter no mínimo de tempo o máximo de rendimento com o mínimo derramamento de sangue. (Hoje o Comando Vermelho consuma em quatro ou cinco minutos um assalto a banco.)

8 – Técnicas para o bando retirar-se do local da ação em tempo record, aproveitando-se da conformação das ruas, do congestionamento, etc., ou provocando deliberadamente acidentes de trânsito.

9 – Planejamento cuidadoso de todas as ações, segundo o princípio de Carlos Marighela: “Somos fortes onde o inimigo é fraco. Ou seja: onde não somos esperados.”

10 – Informação e contra-informação como base do planejamento.

11 – Sistema de “aparelhos” — casas compradas em pontos estratégicos da cidade, para ocultar fugitivos após as operações, guardar material bélico etc.”

A quadrilha de Norambuena seguiu vários destes ensinamentos com precisão, provando que esquerdista, além de ser burro, é acomodado, pois, mesmo com toda a tecnologia do mundo, ninguém pode prever a interferência do acaso, ou melhor, de um simples estetoscópio. A inevitável ligação entre estes terroristas e os esquerdosos do PT já provocou reação em suas eminências pardas. Eduardo “Mogadon” Suplicy já se apressou em dizer que o caso Olivetto não tem relação com o caso Abílio Diniz. Aloísio Mercadante afirmou, junto com José Dirceu, reconhecido agente da KGB com treinamento em Cuba, que estes crimes serão usados contra o PT. A prefeita Marta Suplicy vociferou que o PT está sendo também vítima da violência com os assassinatos de Antonio da Costa Santos e de Celso Daniel. O candidato José “Araguaia” Genoíno berrou que é a favor da prisão perpétua (já José Dirceu disse que o camarada talvez tenha se exaltado com esta declaração). E, finalmente, numa opinião que parecia mais de um desesperado do que de um indignado, o presidenciável Luís Inácio Lula da Silva afirmou, com unhas e dentes, que a culpa da violência não era da esquerda. “A culpa é da direita”, rematou.

Lula talvez não saiba, mas com sua boutade de sindicalista emendou o dito de Hamlet: “Há entre o céu e a terra mais coisas que sonha a tua vã dialética”. Ora, pois, como diriam os portugueses, o PT só está colhendo o que semeou. Como bem observaram Janer Cristaldo e Maria Lúcia Vítor Barbosa, depois de vinte anos elogiando a bandidagem por ser uma forma de mostrar que o povo não agüenta mais a escravidão do sistema capitalista, o Partido dos Trabalhadores, na sua bolha de vestal, acreditou que a morte, esta moça séria, nunca roçaria a sua nuca. Antonio da Costa Santos e Celso Daniel estão aí para provar o contrário.

Mas o desespero do partido prova também que ele está repleto de homens partidos. O Fórum Social Mundial em Porto Alegre é um exemplo de que a esquerda brasileira está desatualizada em relação aos seus companheiros latino-americanos. Observem que isso não é uma boa notícia, já que o atraso não é sobre ideologias ou novas teorias para explicar o mundo. Neste ponto, o Fórum mostra que seu anacronismo ao chamar um velho chato e gagá como Noam Chomsky, é apenas uma forma de refletir que a fase da revolução cultural foi substituída por outra: a da guerra pura e simples. A mídia brasileira não quer ver este detalhe, e prefere chamar o surto de criminalidade de “epidemia”. Por ironia, o único a assumir a verdadeira situação foi um office-boy do Estado, o governador de São Paulo Geraldo Alckmin, que disse a todos que estavámos em guerra. No entanto, não é uma simples guerra contra uma bandidagem iletrada. Há vários Maurícios Norambuenas nas faculdades, nas redações de jornais, na televisões, nas escolas, nos locais de trabalho. Eles não perdem tempo e praticam exatamente o que Osama bin Laden sugeriu na declaração: fazem o possível para que a luta se intensifique dentro do país, tornando o caos uma espécie de ordem aceitável para a maioria da população.

A incompetência da esquerda petista também se mostra ao saber que George W. Bush mandou abrir um escritório da CIA, em plena Avenida Paulista, para descobrir ligações terroristas no Brasil – especialmente, com as FARCs, grupo de guerrilha louvado pelo PT, em que seu estrategista militar é recebido com tapete vermelho no Rio Grande do Sul ou com pompa e circunstância por um deputado paulista. E como eles não querem se relacionar com o terrorismo em hipótese nenhuma – especialmente em um ano eleitoral -, já armaram suas farsas, entre elas uma denúncia no Ministério Público feita por José Dirceu, que acusa a TFP (Tradição, Família e Propriedade) de fazer atentados de extrema-direita contra políticos de esquerda. Dirceu, na sua ansiedade de araponga da KGB, esqueceu-se que a TFP fica restrita a um sobrado de classe média, e que sua renda não dá para mobilizar nem metade dos coquetéis molotov que seria necessário para uma operação terrorista decente.

Ao acusar a “direita” da violência que atingiu seus camaradas, Lula prova ser um sujeito incompetente porque, na sua cabeça de mortadela, mal sabe que, no Brasil, não existe direita. Na verdade, a suposta elite conservadora é um grupo de acomodados, que mamam constantemente na teta murcha do Estado, e bebem na mesma fonte de narcotráfico e guerrilha que o PT endeuseia veladamente. Nunca existiu uma esquerda, e nunca existiu uma direita brasileira – mas sempre exisitiram os oportunistas. O grande exemplo desta constatação é o governo de Fernando Henrique Cardoso, certamente o pior presidente que o Brasil já teve, gramsciano de carteirinha, que permitiu a expansão do Movimento dos Sem-Terra sob o nome de “Reforma Agrária”, a entrada de um ex-terrorista, Aloysio Nunes Ferreira, como Ministro da Justiça, e disseminou a doença espiritual desta nação com uma velocidade pior que a do vírus da AIDS. Nada improvável numa terra papagalis, em que seqüestrador de embaixador americano vira deputado federal ou jornalista na Rede Globo. Coisas da democracia, este regime esquisito que, no fim, desemboca na intolerância da igualdade e transforma a política em um jogo de pé-de-chinelo.

O pretexto da guerra “justa” – termo criado pelo grande ideólogo da Igreja como Estado, Santo Agostinho – foi usado nas respostas aos ataques do Terror de 11 de setembro para fortalecer o Estado e disfarçar suas rachaduras. Quem fica desorientados são os esquerdistas de quinta categoria. Mas, a partir daí, eles tomarão atitudes drásticas: organizar uma onda simultânea de sequestros para desorientar a polícia (como está fazendo o PCC – Primeiro Comando da Capital -, e como fez a quadrilha de Norambuena), espalhar teias de informação e contra-informação (as FARBs suspeitas de ter matado os prefeitos Antonio da Costa Santos e Celso Daniel) e anestesiar a população com ONGs, passeatas pela paz e comícios em homenagens aos mortos, tudo para retardar ainda mais uma guerra inadiável.

Assim, usar um jornalista americano e um publicitário brasileiro como peças de um quebra-cabeça, na qual a política é feita com armas e não com o bom senso, é um mero detalhe. Tanto Norambuena como o Movimento Nacional pela Restauração da Soberania Paquistã são fios que se cruzam numa estratégia que visa nada mais, nada menos, que a tomada do poder. O Fórum Social Mundial ficou quieto em relação a Daniel Pearl e azedou com o sequestro de Washington Olivetto não por remorso ou culpa. Seu silêncio foi um atestado de imbecilidade. A própria esquerda está atrasada na luta que sonhou tanto em entrar. Quem tomou o comando da situação foram os vândalos, os lunáticos e os homicidas. Como o filme de Billy Wilder que dá título a este artigo, o Fórum Social Mundial é o parque de diversões em que o jornalista-toupeira interpretado por Kirk Douglas faz seu grande furo. Mas o parque terminou, a montanha já desmoronou, e os sete abutres procuram novas carnes e novas almas. Quando teremos algum ás na manga?